sábado, 27 de fevereiro de 2010

A paixão

Ardente, flamegante. É o que muitas vezes sentimos, sem qualquer explicação plausível do como, ou porquê. Mas eu não procuro respostas plausíveis. A explicação está na suavidade de um toque, ínfimo mas com poder suficiente para acender uma chama. Chama essa causada pelo toque de pele com pele, suave, macio. Uma chama que nem o maior isqueiro do mundo era capaz de produzir. Está na intensidade de um olhar que vale por mil palavras e apesar de durar apenas o tempo de um piscar-de-olho, é como se tivéssemos tido uma conversa durante horas a fio. A explicação reside ainda num sussurro, junto ao nosso ouvido, proferido tão baixo que se torna responsável por uma cumplicidade inexplicável. A paixão está também na simplicidade de um sorriso sentido, que revela o que nos vai na mente, ainda que por muito o tentemos esconder. A fragrância nostálgica proporcionada por um perfume simples mas inconfundível, o sabor de um par de lábios chorudos e molhados que dão a início a um processo gustativo mais complexo do que a inteira existência do Universo.

Culpo os cinco sentidos por serem a ignição de uma paixão que só termina quando já não houver combustível. Culpo-os quando sinto pele de galinha e a teimosa dita borboleta voa dentro do meu estômago. Culpo-os quando esses teus olhos que escondem menos do que queres fazer parecer me matam ao trazer tudo o que poderia ter sido, mas não foi e quando um sussurro teu era capaz de fazer derreter um iceberg inteiro em pleno Inverno no Árctico. Culpo-os quando distingo o teu cheiro no meio de uma multidão e mesmo sem te ver, eu te consigo sentir ou quando sorris e todos olham para ti porque o teu sorriso é o mais brilhante de todos. Culpo os cinco sentidos, mas é certo que sem eles, eu não seria o mesmo. Ainda assim a culpa que detêm é evidente, estou forçado a gostar de ti. Esse feitiço que me lançaste à traição não permitiu sobrepor a lógica aos malditos cinco sentidos que me condenam a este fogo incansável ainda que inocente.

O Início

Perdão. Peço perdão neste tom poético, emocional ou que lhe desejarem chamar, por ter iniciado este blog sem primeiramente me identificar, com um nickname, ou ter escrito um texto pseudo-irreverente sobre mim ou sobre o fundamento desta página. Apesar de eu ser isso mesmo, um pseudo-irreverente, a minha irreverência vai contra todos os pressupostos formados acerca da irreverência, por isso, contra mim falo e aqui está um post em que me farto de escrever, mas não digo nada de concreto, nem relevante.

Já que não começámos da melhor forma, voltemos a'O Início', ao suposto fundamento do blog. Sobre mim, já sabem o suficiente. Interpretem como quiserem, julguem, critiquem, mandem beijinhos à família que está em França ou digam à mãe que estão na TV. Sobre o blog, é este mesmo, também já sabem para o que serve, apesar de eu não ter declaradamente afirmado, está implícito, e vocês sabem, ou julgam que sabem. Acho que vou ser simpático, e neste terceiro (e único post giro) dizer com todas as letras do teclado que é aqui um frustrado, cobarde como eu liberta tudo o que tem dentro e não quer, ou não consegue dizer em voz alta, nem quando está sozinho. É aqui que se esconde um foragido da realidade e mestre da ficção em alta definição. As vírgulas exageradas são uma característica chata, mas natural, habituem-se.

O sonho



De rojo, levam-me para o topo. Bem, não é certamente o topo que eu sempre quis, mas isso não é importante para vocês. De rojo, trouxeram-me, e vou de rojo, porque me recusei a ir, mas não tenho forças suficientes para vos contrariar. De rojo, arrastaram-me para o topo, quase como se tivesse essa obrigação. E se eu não quiser ir? O que é que isso interessa… Tenho de ir quer queira quer não. De rojo, mas ainda não completamente abatido, após uma luta de 18 anos, quero pelo menos fazer uma pergunta: Valeu a pena? Correu tudo como planeado? A sério, digam-me, valeu a pena? Provavelmente isso também não interessa, tal como a minha opinião não interessou. Enfim, já que estou condenado ao topo, nem que tenha de permanecer lá e rastejar, neste chão húmido e frio onde não posso lutar, choro, rio, deliro e tenho todo o tipo de ilusões.

Mas apesar da minha sanidade ter-se esvanecido à já tanto tempo, há algo que eu nunca cheguei a perder, algo que foi crescendo e crescendo com o tempo e que espero que se torne um dia forte suficiente para me livrar deste tormento. O sonho. O sonho de um dia estas correntes de preconceito e estas amarras de falta de respeito desaparecerem e vocês deixarem de agir como se eu fosse o espelho dos vossos projectos falhados. O sonho de um dia a minha existência ter algum valor, pelo menos mais do que aquilo que vale agora. O sonho de um dia não ter de andar de rojo, e de conseguir caminhar pelo meu próprio pé, poder descer estas escadas escorregadias e ficar bem cá em baixo, sem ser o alvo da vossa pressão e poder decidir por mim mesmo. O sonho de finalmente poder fazer o que gosto e ser quem sou. O sonho de poder chorar, rir, delirar sem ter de me preocupar com o que vocês pensam.
Mas entretanto, quanto tempo faltará para esse dia? O tempo nunca passou tão lentamente, cada bafo meu parece cada vez mais pesado, quanto mais aguentarei? De qualquer forma, até o meu sonho se tornar realidade, tenho de permanecer amarrado, fechado nesta cláusula. De rojo, passa mais um dia, de cabeça murcha, corpo com nódoas e hematomas causados pelos insultos e críticas que prontamente aceito sem ter sequer a chance de responder. De rojo, enfrento mais um dia nesta vida alegre e cheia de vida.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O Disfarce

Disfarçe. Eu também tenho um disfarce. Aliás, tenho vários. Gosto de disfarçar-me de palhaço, com cara pintada de branco e um pequeno grande nariz vermelho e redondo que condiz com uma peruca de cabelo colorido e encaracolado. Dentro deste meu vasto guarda-roupa estão fatos como o de surfista, que consiste apenas de uns calções de banho, uma pele bronzeada e uns óculos-de-sol, o de intelectual, o de descontraído. Todos estes disfarces fazem um só grande disfarce que uso permanentemente. Uso-o por vários motivos. Contudo, nem sempre por boas razões. Mas porquê usar um disfarce?

Apercebi-me que eu sozinho não sirvo para agradar a tanta gente, não sirvo para agradar sequer a mim mesmo, o crítico mais severo e exigente na maioria das vezes. Sem o disfarce é como caminhar desnudo em frente de pessoas desconhecidas do sexo oposto, é como viajar sem passaporte ou andar sem pernas. Já faz parte de mim, e tenho pena que assim seja. Temo que me falte a coragem para o tirar, fora da solidão da minha mente, seria uma exposição enorme que provavelmente não me iria ajudar.

Este disfarce tem cortes e buracos de tantos anos de uso e começo a pensar se em vez de arranjar um novo não deveria simplesmente ver-me livre dele, e sentir-me livre. Mas depois volto a mim mesmo. O seu peso, é um peso ao qual já estou habituado e já carrego com uma indiferença inidentificável na maioria das vezes. Uma parte de mim deseja que o disfarce desapareça e que todos me olhem assim como sou sem ele, julguem o que tiverem a julgar. Uma parte de mim está disposta a correr esse risco. Estou em dúvida, se esse será o meu lado fraco, que não aguenta, ou o corajoso, que não teme. De qualquer das formas, isso não vai acontecer, pois sou ambos cobarde e fraco e essa desilusão seria tremenda.

Ainda se houvesse alguém que conseguisse ver através da máscara. Alguém que me olhasse nos olhos, e percebesse que por muito bom que seja o disfarce, eu nunca serei assim, alguém que me entenda e ainda assim resolva ficar comigo e não desista de mim, alguém que me ajude a tirar o disfarce, me dispa do medo e da fraqueza e me ajude a tornar naquilo que sou com ele, mas sem ter de o utilizar.